CARTA DE FORTALEZA
Entre os dias 26 de fevereiro e 1o de março de 2024, na cidade de Fortaleza, no Ceará, terra de lutas e resistência de povos indígenas, quilombolas, de lembranças da Seca do Quinze, do Caldeirão da Santa Cruz do Deserto e da resistência do povo sertanejo, realizou-se o 42o Congresso do ANDES-SN com o tema: “Reverter as contrarreformas, em defesa da educação, dos serviços públicos, das liberdades democráticas e direitos sociais”. Nossos murais e cartazes apresentaram a imagem de jovens que pulam sobre uma estrutura de madeira, retratando a intervenção humana numa paisagem em que as águas salgadas do mar resistem ao que está fora do quadro da imagem: o avanço da sombra dos prédios e da especulação imobiliária. Essa dialética entre o que está em quadro e fora de quadro marca não só a imagem, mas essa constante necessidade de resistirmos em uma sociabilidade com tantas contradições.
E foi na Universidade Federal do Ceará que um dos maiores congressos da história do ANDES-SN contou com a presença de 457 delegadas, delegades e delegados, 132 observadoras e observadores de 86 seções sindicais, 7 convidadas e convidados e 36 diretores(as) que aprovaram o plano de lutas apresentado no 42o Congresso, marcado pelo retorno histórico da ADUFC – nossa anfitriã – e da Adufscar à base do ANDES-SN, além da incorporação do Sindfames e do SindUnDF, seção sindical que ao integrar à base do ANDES levou a mudança do nome do nosso setor das IEES/IMES e IDES. O retorno da ADUFC foi marcado por emoções e homenagens àqueles(as) professores e professoras que construíram sua história e que foram fundamentais neste processo de reincorporação da ADUFC à base do ANDES-SN, inclusive, contamos com a presença especial do professor Agamenon Almeida, primeiro presidente da ADUFC e ex-diretor do Sindicato Nacional que neste encontro foi abraçado por seus companheiros(as) e camaradas de longa data.
Sob a potência dos tambores do Maracatu Solar, uma expressão de origem popular e africana, que contagiou todos os presentes com seu ritmo, as e os congressistas iniciaram os trabalhos com a presença e saudação de movimentos sociais e sindicatos, que na mesa de abertura reafirmaram o compromisso da luta unificada da classe trabalhadora. O presidente Gustavo Seferian, em sua fala de abertura, destacou a alegria das homologações de seções sindicais – novas e reincorporadas – lembrando que o ANDES-SN está em greve, em razão da forte luta que desde 2 de janeiro de 2024 vem sendo conduzida pelos professores e professoras da UESPI, frisando o papel das estaduais em suas lutas – sobretudo no Paraná e no Maranhão. Somou-se à sua fala o entoar da resistência de professores e professoras criminalizadas(os) na luta, sendo o caso da companheira Jacyara Paiva, da Adufes, o mais enfaticamente registrado e aclamado.
Tratou ainda do período que esteve em licença-paternidade em virtude do nascimento de sua filha Nise, registrando a importância desse direito ao conjunto da classe trabalhadora, não só aos pais, mas também às mães, dado seu potencial de fratura com registros estruturais da divisão sexual do trabalho. Antes de iniciar sua fala, porém, fez dois registros de memória: a emoção tomou conta do plenário no momento em que foram prestadas homenagens à professora, companheira, mãe, militante e ex-presidenta do
ANDES-SN, Marinalva, e ao camarada, militante e poeta, Alex. O legado de luta, sensibilidade, poesia e paixão de Marinalva e Alex estará sempre presentes em nossos corações e mentes, e continuará a nos fortalecer em lutas fundamentais desse Sindicato.
Marinalva Presente! Alex Presente!
Diante do genocídio na Palestina perpetrado pelo estado sionista e fascista de Israel, o 42o Congresso aprovou de forma unânime, em sua primeira deliberação, uma moção exigindo do governo brasileiro o rompimento das relações diplomáticas com Israel, manifestando a solidariedade irrestrita ao Povo Palestino, além da realização de um ato público pelo fim do genocídio e pela sua autodeterminação. Pelo cessar fogo imediato! Não é guerra, é genocídio! Reafirmamos, PALESTINA LIVRE!
Durante a mesa de conjuntura, conduzida pela diretora Leticia Carolina Nascimento, primeira mulher trans a assumir esta tarefa em nosso sindicato, o Coletivo de professoras(es) negras, negres e negros tomaram a frente da plenária com um importante ato em solidariedade à professora e dirigente sindical, Jacyara Paiva, que sofre uma ameaça de exoneração da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).
JACY FICA, O POVO NEGRO FICA!
Frente a uma conjuntura nacional de arrocho salarial contra os e as docentes das Instituições de Ensino Superior Federais, Estaduais, Municipal e Distrital, o 42o Congresso do ANDES-SN aprovou a construção da greve do ANDES em articulação com o setor da educação já no primeiro semestre de 2024, em uma resposta direta à recusa do governo federal em negociar com a categoria. Além disso, reafirmou-se o apoio incondicional à greve dos(as) docentes da UESPI, levada a cabo diante dos ataques do governo de Rafael Fonteles, do PT, que, movimentando o judiciário para criminalizar quem luta e de forma intransigente, promoveu dois cortes de salários aos(às) docentes que estão exercendo o seu legítimo direito de greve. Articulando a luta nos estados e no âmbito federal também foram aprovadas resoluções para o enfrentamento dos Regime de Recuperação Fiscal e seus impactos para a carreira docente.
Importante foi o reforço à luta contra as intervenções nas universidades no Setor das IFES, visto que a UFC, universidade que nos acolheu, foi uma das mais de 20 instituições de ensino superior que resistiram às intervenções durante o governo Bolsonaro diante da expressão do negacionismo e do autoritarismo.
Em relação à política educacional, o Congresso aprovou a continuidade da luta contra as diversas políticas educacionais que se caracterizam como contrarreformas, tais como o NEM, a BNC formação, a BNCC, o avanço da EaD em todos os níveis de ensino e o combate à atuação do setor empresarial na educação, especialmente no que se refere à disputa do PNE. Os e as congressistas deliberaram, ainda, pelo diálogo com as entidades de educação do campo classista para debater a possibilidade de rearticulação da CONEDEP e a construção do IV ENE, com a finalidade de acumular para a elaboração
de um PNE que atenda aos interesses da classe trabalhadora. Além disso, foi aprovado que o GTPE discuta e oriente às seções sindicais para a avaliação sobre a possível participação no Fórum Nacional Popular de Educação e o Fórum Nacional de Educação para deliberar no 67o CONAD.
A partir da avaliação da plenária sobre a Política de Formação Sindical, as delegadas e delegados aprovaram que o ANDES-SN envide esforços para rearticular o Fórum Sindical, Popular e da Juventude e a CNESF, na perspectiva de ampliar a construção de luta e unidade com a classe trabalhadora. Ao mesmo tempo, caberá ao ANDES-SN propor e articular com o Fonasefe, os fóruns dos(as) servidores(as) públicos(as) dos estados, e com o setor das IEES-IMES-IDES a realização do II Encontro Nacional dos Trabalhadores(as) do Setor Público. Também foi dado destaque para a construção do curso nacional de formação política com o tema “60 anos da ditadura-militar empresarial, temário que também fará parte do Seminário Nacional da política de história do Movimento Docente no ano que completamos 60 anos da Ditadura Militar-empresarial no Brasil.
A solidariedade de classe foi a tônica do nosso congresso, quando as(os) delegadas(os) não titubearam em seguir apoiando financeiramente diferentes movimentos sociais, e nesta conjuntura, em especial, o Sindicato dos Profissionais de Educação do Estado do Rio de Janeiro (SEPE-RJ) que foram fortemente impactados com multas depois de um fundamental movimento paredista de 2016.
Um outro tema que inflamou o plenário foi a discussão sobre o cabimento ou não de realização de atividades virtuais no âmbito dos Grupos de Trabalho, que teve ampla discussão e deliberação em defesa da presencialidade, o que sustenta a nossa concepção sindical. Foi expressiva a entoação das(os) congressistas: Eu sou do ANDES, sou radical, eu vou à luta de forma presencial!
No debate sobre Políticas de Classe para as Questões Étnico-raciais, de Gênero e Diversidade Sexual, o Congresso aprovou a realização de uma campanha nacional de combate ao racismo no ensino superior, com ações de incidência pela efetiva implantação da Lei n.o 10.639/2003 e Lei n.o 12.711/2012. Essa aprovação é fundamental para aprofundarmos a luta de enfrentamento ao racismo estrutural que marca a vida de professoras e professores negras, negres e negros que sofrem cotidianamente em nossas
universidades, Institutos e Cefets.
Entre os intensos debates e discussões do 42o Congresso do ANDES-SN, os e as congressistas vivenciaram momentos de extrema emoção com a música do artista Rodger Rogério, professor aposentado da UFC, um dos maiores cantores e compositores do Ceará, preso político que resistiu à ditadura militar-empresarial brasileira. E se a luta e a determinação são essenciais para a construção do plano de lutas que nos animará ao longo da próxima quadra, é com a poesia de um militante que nos deixou que reforçamos o sentido de tudo que aqui estamos construindo:
Seguiremos firmes o caminhar nas veredas que a base decidir atravessar, combatendo o reformismo dos governos e o neoliberalismo do mercado, Jamais nos renderemos ao rentismo, faremos os enfrentamentos necessários juntes da classe e pela base até derrotarmos o capitalismo.
(em memória de Alex Santos)
Fortaleza, Ceará, 1o de março de 2024.