Ameaça de violência à comunidade quilombola de Queimadas em Serro (MG)
A comunidade quilombola de Queimadas em Serro ficou conhecida nos últimos anos pela resistência à chegada de mineradoras em seu território. Recentemente, o quilombo obteve importantes vitórias judiciais na esfera Federal, com a paralisação de dois processos de licenciamento ambiental das mineradoras Herculano Mineração e Ônix Céu Aberto, em virtude de ausência da Consulta Livre, Prévia e Informada à comunidade, conforme exigido pela Convenção 169 da OIT, da qual o Brasil é signatário.
Porém, as mineradoras com o apoio da prefeitura municipal tem atuado sistematicamente no território mesmo sem autorização, construindo estradas sem licenciamento ambiental e desrespeitando o processo de consulta prévia que deve ser livre de interferências das empresas e do poder público. Em abril de 2023, moradores que atuam em defesa da comunidade e militantes do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), foram alvos de violências e ameaças. O fato ocorreu dentro do quilombo Queimadas quando uma reunião da comunidade sofreu a invasão de fazendeiros, funcionários e apoiadores das mineradoras. Eles tentaram intervir contra a apresentação do estudo do Ministério Público que descreve as localidades pertencentes ao território quilombola. Todo o episódio foi documentado em Boletim de Ocorrência, depoimentos para a Polícia Federal, e em Audiência Pública na Assembleia Legislativa de Minas Gerais.
O MAM vem denunciando que o conflito no Serro e em Queimadas tem se acirrado, desde que um grupo de apoiadores das mineradoras assumiu a diretoria da Associação Comunitária e Quilombola de Queimadas. Esta diretoria, que tem em sua composição pessoas não quilombolas, têm violado expressamente o estatuto da Associação e os direitos quilombolas. Seus membros têm atuado também para impedir a atuação da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais N’Golo na comunidade, disseminando notícias falsas e realizando campanhas difamatórias contra Dr. Matheus Mendonça Leite, advogado da entidade.
Agindo de forma a garantir os interesses da mineradora Herculano, este grupo está tentando elaborar um falso Protocolo de Consulta, documento que guiará como será o processo de Consulta Livre, Prévia e Informada da comunidade. A diretoria convocou uma reunião em caráter de urgência no dia 17/03/2024 na sede da Associação e tem pressionado os moradores pela sua aprovação. A não participação efetiva dos quilombolas da comunidade na construção do protocolo de consulta infringe o princípio da Convenção 169 da OIT, e é isto que esta reunião às pressas, sem construção com os moradores, representa.
Durante a última semana, militantes do MAM voltaram a ser alvo de ameaças. Citamos especialmente as ameaças voltadas contra Juliana Deprá Stelzer e Valderes Quintino Silva. Mas, infelizmente, estes não foram os únicos militantes do movimento que sofreram ameaças verbais ou virtuais por se posicionarem contra a mineradora Herculano. Também ressaltamos que Samantha Reis, moradora do Serro, e o advogado da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais N’Golo, Dr. Matheus Mendonça Leite, foram alvo de ataques variados pelo mesmo grupo neste período.
A coordenação do MAM avalia que a reunião do dia 17/03 foi marcada de modo equivocado, sem respeitar a participação popular dos moradores e é portanto ilegítima. Avaliamos que o clima de ameaças contra aqueles que se colocam contrários à instalação do projeto da mineradora Herculano é uma grave ameaça à participação das pessoas, visto que moradores e apoiadores que tem se manifestado de forma contrária sofrem o risco de também serem intimidados e ameaçados. Nos preocupamos com a segurança física de todos aqueles que irão comparecer à reunião e, em especial, com aquelas pessoas que já foram ameaçadas. Importante ressaltar que todas as situações foram devidamente registradas, foram noticiadas pela imprensa e estão em investigação através de inquéritos policiais.
Trata-se de mais um episódio de profundas violações de direitos humanos cometidos pelas mineradoras do Serro e contra o quilombo de Queimadas. O MAM, a Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais N’Golo, o Movimento Pelas Águas e lideranças quilombolas locais têm atuado juntos, acionando parceiros, instituições e parlamentares para que intervenham nessa situação de ameaças, de violações de direitos e para que garantam as condições necessárias para que a comunidade possa livremente construir esta ferramenta tão importante, que é o seu protocolo de consulta prévia.
É necessário a segurança das pessoas ameaçadas, e de todos que estiverem presentes na reunião do dia 17, caso ela de fato ocorra. Também demandamos que os procedimentos, já muito consolidados no Brasil sobre a realização de protocolos de consulta, sejam também respeitados para a comunidade de Queimadas.
Minas Gerais, 15 de março de 2024.
Movimento pela Soberania Popular na Mineração – MAM